sexta-feira, 29 de setembro de 2017

SOBRE PALESTRAS E PALESTRANTES

 
Faz um tempo que li na internet um anúncio com três perguntas que me inquietaram e seguem me desassossegando: (1) Já pensou em se tornar um palestrante? (2) Já pensou em viver de palestras? (3) Quer aprender como construir um negócio de palestras começando do zero?
Sempre pensei que antes de tornar-se um palestrante viriam os estudos, os aprendizados, as convivências e depois de muita experiência, aí então teríamos algo a partilhar, que poderia ser num encontro, numa roda de conversa, numa oficina, workshop ou numa palestra. Mas quando leio essas três perguntas fico com muito medo de um futuro não tão distante, cheio de pessoas falando, sem nenhum conhecimento de causa, sobre os mais variados temas. Ops, acho que esse futuro já chegou!!
Ano passado a equipe da Secretaria de Educação de um município me questionou se eu faria uma fala sobre cultura afro-brasileira ou educação indígena. Respondi que poderia fazer uma oficina sobre contos africanos e indígenas, já que sou contadora de histórias. Depois agradeci o convite e indiquei o nome de dois colegas que são estudiosos nessas temáticas. Seria fácil fazer uma pesquisa e falar sobre um desses temas, mas não tenho trajetória profissional com experiência suficiente para abordá-los com propriedade.
Penso que ser palestrante não é uma profissão, é consequência de um percurso de vida, com acúmulo de conhecimentos e experiências que podem ajudar a ampliar o conhecimento ou desacomodar outras pessoas, produzindo nelas inquietações que possam lhe conduzir a novas experiências capazes de ampliar sensações, percepções e conhecimentos.
Tenho visto muitas pessoas investindo no “mercado de palestras”, principalmente para a “formação de professores” ou de “seres humanos”. Isso me dá uma certa aflição. Chegamos ao ponto de alguém ter que nos ensinar e nos treinar para sermos humanos, como se isso fosse algo possível de ser aprendido na fala do outro e não nas vivências cotidianas.
E nesse mercado, se souber fazer graça no palco o cachê sobe. Será mesmo que as pessoas estão tão anestesiadas que se alguém subir num palco para falar sobre saúde, educação, política, relações de trabalho, ou outro tema relevante, o conteúdo do que é apresentado é tão menos importante do que a forma? É claro que uma palestra ou uma aula insossa dá sono na gente, mas não podemos tornar nossos espaços de reflexão num “stand up comedy”. 

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