quinta-feira, 19 de julho de 2018

ERA UMA VEZ NA UTI


Quando o Arthur, meu filho mais novo, nasceu, o primeiro lugar para onde foi levado, foi a UTI Neo Pediátrica do Hospital Santa Cruz. Foi lá que começamos a nos conhecer. E foi lá que fomos descobrindo juntos que a vida não seria exatamente como tínhamos planejado, que teríamos que replanejar, ou melhor, aprender a não planejar. Aprendemos também que nossa rotina seria meio fora da rotina.
Nestes 8 anos de vida do Tutuks, voltamos várias vezes para a UTI e outras tantas para a enfermaria, a fim de tentar minimizar suas tempestades cerebrais. Junto com o Tuks, conheci muita gente bacana, médicos, equipe de enfermagem, nutricionistas, equipe da copa, do lactário e da higienização.
Conhecemos também muitas mães, especialmente mães de bebês pequenininhos e frágeis, bebês que tiveram pressa para nascer. A gente vive uma rotina diferente da nossa quando estamos no hospital, mas como moramos na mesma cidade, temos pai, irmão, babá, amigos, família, um montão de gente perto pra ajudar a resolver a vida. Mas muitas mães de bebês apressados vêm de longe, não tem ninguém pra partilhar as angústias, o cansaço, a rotina. Aprendi - aprendemos eu e o Tutuks - ao longo desses anos, que quando cabeça de mãe fica cansada, muitos pensamentos que não são legais passam por lá. Por isso leio histórias, leio muitas histórias e ouço muitas canções, para que estejamos eu e o Arthur (assim como foi, como é, com o João – meu filho mais velho) conectados amorosamente.
Num desses dias de internação, que já são muitos, quase seis semanas, fui contar histórias para as crianças da Ala Pediátrica e a equipe da UTI me pediu para contar para elas também. Contei para equipe de enfermagem e para as mães. Depois conversamos um pouco e falei de como é importante para mim contar histórias para meus filhos, de como sinto que as histórias me colocam numa conexão bacana com eles.  Sugeri que elas poderiam fazer o mesmo. Histórias que embalam, como o colo que gostariam, mas ainda não podem dar a seus pequenos. Mas como sugerir que contem histórias sem livros?
Foi então que nasceu a ideia de criar uma pequena biblioteca, onde livros infantis e contos pudessem estar à disposição das mães, dentro do espaço que dá acesso à UTI e à UCI do Hospital Santa Cruz, para que possam ler para seus pequenos. A ideia brotou com uma certa urgência, porque as mães estavam ali agora. Conversei, troquei ideia, articulei e nasceu o Espaço Era Uma Vez, com todos os cuidados tomados para a higienização dos livros. Agora, pais e mães podem contar histórias para seus pequenos e estarem mais próximos, mais conectados física e amorosamente, criando memórias afetivas desde muito, muito cedo.

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