sexta-feira, 28 de julho de 2017

SE VOCÊ NÃO ESTÁ COMIGO, ESTÁ CONTRA MIM?

Cada vez que escrevo algo, sou responsável pelo que escrevo, mas não pelo que cada um entende do que lê na minha escrita. Assim são as palavras e assim são as pessoas. Cada um que lê um texto – um livro, uma entrevista, uma reportagem – o faz a partir da sua história de vida, das suas concepções e percepções acerca da vida.
Quando lemos algo que vai ao encontro dos nossos princípios, há uma grande chance de gostarmos do que lemos, porque logo assimilamos e nos identificamos. Por outro lado, quando lemos algo que colide ou não se encaixa como um lego com o que pensamos, há uma grande chance de reagirmos abruptamente ao que lemos.
Vivemos um tempo em que muitas pessoas escolhem uma bandeira para levantar, uma causa por que lutar. E isso é bom, principalmente quando o fazem com sabedoria e sem raiva. Alguns conseguem, outros não. Acho triste quando alguém coloca a sua causa acima de todas as outras e exige que o resto do mundo pense do mesmo modo, lute pela mesma causa e da sua maneira. É neste momento que surge esse pensar fragmentário: “se você não está comigo, está contra mim”. Convivemos todos os dias com pessoas assim.
Semana passada o cantor Ney Matogrosso, em entrevista à Folha de São Paulo, ao ser perguntado se em algum momento considerou-se representante de uma minoria, respondeu: “ Eu não defendo gay apenas, defendo índios [o Ney participou a pouco de um vídeo, junto com outros artistas, pedindo a demarcação de terras indígenas], defendo negros [...]. Me enquadrar como “o gay”, seria muito confortável para o sistema. Que gay o caralho. Eu sou um ser humano, uma pessoa. O que eu faço com a minha sexualidade não é a coisa mais importante da minha vida”.
O Ney é um profissional com quase 45 anos de estrada e que deu a cara a tapa desde o início da carreira, apenas sendo quem é. Está com 75 anos de idade e tem muita lucidez sobre o que fala. Se concordo com tudo que ele fala? Posso não concordar, mas preciso ser coerente.
Houve, após a entrevista, quem dissesse que o Ney é “um artista genial que perdeu o andar que o mundo tomou, ficou cristalizado”. Sério?! Cristalizado?! Penso que ser coerente e entender que há muitas minorias que são maioria nesse país de tantas desigualdades e não ‘cristalizar-se’ frente a uma causa apenas, negligenciando todas as outras é ser razoável e lúcido.
Cada um tem o direito de investir seus esforços nas causas que mais lhe sensibilizam e também escolher o modo como se sente mais eficiente ajudando a causa que apoia. Se eu não levanto a sua bandeira como você escolheu levantar, não significa que esteja contra ela ou contra você. 

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