sábado, 27 de agosto de 2016

SOBRE POTÊNCIA, DEFICIÊNCIA E PARALIMPÍADAS

Essa semana circulou nas redes sociais a campanha “Somos todos Paralímpicos”, na qual Cleo Pires e Paulo Vilhena aparecem com seus corpos modificados. O anúncio da campanha traz Cleo Pires na pele de Bruna Alexandre, atleta do tênis de mesa, e Paulo Vilhena com o corpo de Renato Leite, atleta da categoria vôlei sentado. O propósito da campanha, idealizada pelos atores com o apoio do Comitê Paralímpico Brasileiro e dos atletas, é sensibilizar as pessoas e atrair um maior público para as competições das Paralimpíadas, que ocorrerão entre os dias 7 a 18 de setembro de 2016.
Nas redes sociais eu só ouvi (com os olhos) críticas sobre a campanha e confesso que fiquei um tanto perplexa com os ecos que ouvi. Logo pensei em escrever sobre a questão, mas decidi primeiro perguntar a várias amigas que trabalham diretamente com pessoas com deficiência (fisioterapeutas, fonoaudióloga e psicóloga) – sem dar a minha opinião, é claro – o que haviam achado da campanha. Todas foram unânimes em dizer que acharam interessante, que a ideia é bacana, que não se chocaram e também não se sentiram incomodadas.  Depois foi a vez da enquete com meus estagiários do Estágio Supervisionado em Fisioterapia e por fim, um bate papo com a minha turma de Fisioterapia Neurofuncional II. De novo, a conclusão foi a mesma. Resolvi então, escrever esse texto, para que a nossa percepção pudesse ser compreendida por outras pessoas.
Queríamos (e queremos) que os atletas paralímpicos tivessem o mesmo reconhecimento que tem os atletas olímpicos como Usain Bolt, Michael Phelps, Simone Biles, Diego Hypólito, Marta e Neymar. Mas não tem, ainda não!! Seus nomes ainda não são suficientes para chamar um grande público. É pouco provável que as Paralimpíadas tenham a mesma cobertura da mídia que as Olimpíadas tiveram. Que bom que essa campanha não fosse necessária para dar visibilidade, que atores não precisassem emprestar suas imagens para sensibilizar a população, mas é.
Não gosto do slogam #somostodos..., mas a questão é tão mais profunda, que é difícil saber por onde começar. Trabalho com pessoas com deficiência a cerca de 27 anos, sou fisioterapeuta, professora e mãe de uma criança com uma grave deficiência motora. Sempre me incomodou esse discurso do “inho”. O deficientezinho, pobrezinho, sequeladinho, necessitadinho. Se não está no discurso está nas atitudes da maior parte das pessoas.
Inclusão não se faz só nas escolas. Inclusão se faz na rua, nas calçadas, nos hotéis, nos shoppings, nos cinemas, nas livrarias, nas bancas de revistas e nas revistas. Na verdade, não se faz, fica só no discurso do politicamente correto, mas na prática não se faz.
Penso que as Paralimpíadas não colam como colam as Olimpíadas porque grande parte da sociedade ainda não olha para as pessoas com deficiência e veem nelas a potência. A deficiência ainda é o que mais fica em destaque!! As Olimpíadas é o lugar da potência e as Paralimpíadas também. As Olimpíadas é lugar de superação e as Paralímpiadas também. Os (par)atletas não são super homens, super heróis, são pessoas, de carne e osso, que dão o seu suor e o seu melhor para se superar dia a dia, com todas as limitações não só físicas, mas econômicas, sociais e estruturais. Não gosto do discurso que os coloca num lugar de não humanos, porque isso esvazia o discurso e desvaloriza o que de fato são, pessoas incríveis, cheias de potência. Não são “inho”, são “ão”, mas são humanos.
Além da campanha #Somos Todos Paralímpicos, a edição de setembro da Vogue Brasil trará um ensaio fotográfico protagonizado por Cleo Pires e o (par)atleta Renato Leite. Não acho que a edição de setembro será uma campeã de vendas, mas acho ousado a Revista Vogue aceitar realizar esse ensaio. Muita gente se sentirá incomodada, com certeza. Afinal, a Vogue é uma revista voltada à beleza e seus padrões ideias. Mas muito cuidado com suas percepções. Sabe aquele sentimentozinho de “que aberração”!! Pois é, não precisa falar, só de sentir uma pontinha dele já mostra que você pensa em inclusão só no discurso, porque se para você uma pessoa com deficiência não pode estar na Vogue é porque você ainda pensa que ela só pode ocupar o espaço do “inho”. #Fiqueatento!! 

Nenhum comentário:

Postar um comentário