quinta-feira, 11 de fevereiro de 2021

DEIXE A LOUÇA PRA DEPOIS

Quando era criança, domingo era dia de almoçar na casa de meus avós maternos, que moravam num sítio, onde criavam vacas, porcos, ovelhas e galinhas. Sempre que possível, tios e primos apareciam para o almoço ou café da tarde. 

Depois do almoço, as mulheres ficavam um longo tempo conversando, sem se afastar muito da mesa. Meu pai e meu avô iam tirar um breve cochilo, mas não demoravam a voltar. Talvez, por esta razão, era comum que emendássemos o almoço com o café da tarde.

Quando cresci um pouco, lembro de certos domingos que, quando alguém fazia um movimento para começar a lavar as louças, minha mãe logo dizia que os pratos podiam esperar, que quando começamos a lavar a louça a turma dispersa e a conversa também.

Tenho grande apreço pelas conversas tecidas em volta da mesa. Talvez, despertem em mim a memória ancestral de quando sentávamos em torno do fogo para ouvir e contar histórias, ou apenas uma memória de infância, que contada tantos anos depois, deve ser bem diferente dos dias vividos naquele tempo outro.

Memória de infância nunca é o resgate de um fato, mas do modo como lembramos e dos sentimentos que colocamos sobre o fato lembrado. É provável que minha mãe, tias e irmãs, não guardem as mesmas lembranças do tempo compartilhado. Cada uma de nós terá sua própria memória, temperada com diferentes condimentos afetivos.

Carrego ainda hoje comigo a necessidade de sobremesa e cafezinho para todos os almoços em família, ou entre amigos. Penso que ambos são apenas pretexto para ficarmos mais tempo juntos à mesa, para puxar à memória uma receita, uma história, uma lembrança, para amarrar a junção e prolongar o tempo.

Durante o longo tempo que dura a pandemia, me esforcei para preparar ao menos uma refeição em casa e reservar tempo para o cafezinho e para a conversa. Ainda que os almoços com a família ampliada tenham sido adiados para logo ali e com os amigos para um pouco depois, poder fazer uma refeição com alguém que se dispõe a partilhar a mesa e a conversa é um grande privilégio que torna esse tempo um pouco mais suave.

 


 

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