quinta-feira, 6 de fevereiro de 2020

TAMAGOTCHI DE GENTE GRANDE


Durante uma conversa, contei empolgada que havia comprado um processador manual para fazer macarrão de legumes. Uma das pessoas que estava na conversa perguntou porque razão uma pessoa com titulação acadêmica, que trabalha e tem independência financeira, se interessaria em comprar eletrodomésticos e equipamentos de cozinha. Dei a única resposta possível: É que eu gosto de cozinhar.
O filósofo alemão, Arthur Schopenhauer (1788-1860), certa vez escreveu que “uma pessoa de raros dons intelectuais, obrigada a fazer um trabalho apenas útil, é como um jarro valioso, com as mais lindas pinturas, usado como pote de cozinha”. Acho que meu amigo desfruta, em certa medida, do pessimismo de Schopenhauer. O que os dois não entendem, é que talvez, apenas talvez, se o trabalho útil não for obrigatório, a pessoa que o executa possa encontrar algum prazer em realizá-lo.
Muitas vezes, cumpro com os afazeres domésticos porque preciso, outras tantas, os faço por puro prazer. Adoro preparar um bolo para receber um amigo. E nas férias, fico inventando comidas diferentes, experimentando receitas, como uma criança que brinca de casinha com lama, grama e pedrinhas. Nesses fazeres brincantes, produzo meu próprio iogurte e atualmente aprendi a fazer minhas próprias kombuchas (bebida produzida a partir de um chá fermentado). Não preparo meu iogurte e minhas kombuchas apenas para economizar dinheiro, mas porque me dá grande prazer acompanhar o processo, acertar o ponto do iogurte e da fermentação do chá. 
No final da década de 1990, houve uma febre no mercado de brinquedos, produzida pelo surgimento dos tamagotchis. O tamagotchi, era um bichinho de estimação virtual. E a brincadeira, levada muito a sério pelas crianças, era cuidar do animalzinho como se fosse real, dando-lhe carinho, comida, banho, todos realizados virtualmente. Minha colônia de kefir (usada para o preparo do iogurte) e meus scobys (cultura de bactérias e leveduras responsável pela gaseificação da kombucha) são meus tamagochis. Preciso cuidar direitinho deles para que estejam sempre saudáveis.
A gente pode encontrar muitos modos de ser feliz com pequenas alegrias cotidianas. Há quem goste de cuidar de plantas, de cultivar um lindo jardim, ou plantar suas próprias hortaliças. Há quem teça toucas e sapatinhos de lã para seus netos ou netos de outros. Há quem cuide de um ou muitos animaizinhos de estimação. Há quem goste de ver a semente germinar e virar broto e quem aprecie colocar a mão na massa para sovar o pão.
Todas essas possibilidades são trabalhos úteis que, quando não realizados por obrigação, podem trazer muita satisfação. Há também quem encontre satisfação mesmo quando os realiza por obrigação e coloque em dúvida o pessimismo de Schopenhauer e do meu companheiro de prosa.


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