quinta-feira, 19 de dezembro de 2019

ABRA SUA CAIXINHA DE CORREIO

“Poucas vezes meu corpo me derruba. E me assusto quando ele faz questão de mostrar que quem manda na nossa relação é ele”. Foi assim que finalizei a mensagem que escrevi há poucos dias para uma amiga. Naquele dia era para estarmos juntas, mas eu não consegui, meu corpo não deixou, puxou o freio de mão.
Isso acontece com boa parte das pessoas com quem convivo. A gente vai tocando a vida, colocando as tarefas profissionais, acadêmicas e escolares como prioridades absolutas. Raras são as vezes que somos prioridade em nosso próprio cotidiano. Frequentemente vamos ao limite do cansaço físico até que, incapazes de dizer chega, o nosso corpo fala por nós.
Sim, o corpo fala. Ele avisa que está cansado, manda uma dorzinha aqui, uma contratura ali. Ele também avisa quando está no limite, aumentando a intensidade ou a frequência daquela dor ou desconforto. Mas, a gente vai empurrando pra depois, pra quando sobrar um tempo que não sobra nunca.
Nessas horinhas o corpo, o nosso corpo, passa a ser percebido como um incômodo, que nos limita, que entrava nossos projetos. E já que somos incapazes de dialogar com ele, de perguntar gentilmente o que ele tem, de que modo podemos ajudá-lo, tentamos calá-lo, com analgésicos, antiinflamatórios, antiácidos e relaxantes musculares.
Podemos não responder a e-mails ou mensagens no whatsApp, mas é quase impossível não responder ao correio do corpo. Podemos deixar pra depois, mas haverá um momento em que o carteiro baterá com tanta força em nossa porta que será impossível não escutar suas batidas.
É fácil perceber que estamos cada dia mais acelerados. Podemos dizer que a culpa é da tecnologia, que foi chegando na esperança de tornar a vida mais fácil e acabou por torná-la mais apressada. Mas a tecnologia não faz nada sozinha. Um liquidificador não funciona se não dermos função a ele.
Se conseguirmos compreender isso, talvez sejamos capazes de perceber que a culpa não é da tecnologia, mas de nossas prioridades. Afinal, sou eu a responsável por administrar o meu cotidiano. Apenas eu posso dialogar com minhas rotinas e com meu corpo. A chave dessa caixinha de correio é minha.
Essa é mais uma daquelas que chamo de “crônica egoísta”. Estou escrevendo para mim e partilhando com você, que pode, como eu, ter uma grande dificuldade de escuta do próprio corpo. Talvez você, como eu, também seja um tanto procrastinador, ou procrastinadora, do cuidado de si. Talvez você, como eu, também se esqueça onde colocou a chave da caixinha do correio. Talvez também precise, vez ou outra, que alguém avise que é hora de encontrar a chave e organizar a casa corpo. Porque se não fizermos isso, nosso corpo vai nos lembrar da bagunça que fizemos.
Que neste Natal o Papai Noel traga uma cópia extra da chave da nossa caixinha de correio e que tenhamos muito cuidado para deixá-la guardadinha num lugar onde a memória possa sempre encontrá-la. Que o espírito natalino desperte nossa capacidade de dialogar mais e melhor com o outro e com nosso próprio corpo. Feliz Natal!! 

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