No mundo da mitologia o sofrimento é, com
frequência, fruto de um castigo. Na vida contemporânea evita-se falar sobre ele,
como se falar sobre temas como sofrimento, doença ou morte fosse um mau agouro.
Nessa lógica, muitos adultos vão buscando formas de negar às suas crianças
experiências desagradáveis ou frustrantes, como se o sofrimento fosse algo inteiramente
ruim e a felicidade plena e contínua fosse algo possível de ser alcançado.
Nós, seres vivos, aprendemos com todas as
experiências vividas. É verdade que nem todas elas serão prazerosas, mas
aprenderemos. Por exemplo: para aprender a andar de bicicleta uma criança
levará muitos tombos, esfolará os joelhos, sentirá dor. Mas quando tiver
aprendido a andar na sua bicicleta, a dor sofrida será uma experiência passada
e já não significará mais sofrimento. O que prevalece é a alegria da conquista.
No entanto, se quiser aprender novas manobras em sua bicicleta, ela terá que
sofrer outras quedas, poderá até quebrar um braço ou uma perna, mas continuará
tentando. E a alegria virá a cada nova conquista. E cada manobra exitosa será
uma experiência de felicidade.
Neste sentido, sofrimento e alegria não são
antagônicos, mas interdependentes. Não somos necessariamente vítimas nem heróis
numa situação de sofrimento, apenas somos. Acontece que para muitas pessoas, apenas
ser não parece suficiente, é preciso demarcar território. Se você circula pelas
redes sociais poderá ver dois tipos de situação se repetindo diariamente. A
primeira é a pessoa feliz, sempre, sobre qualquer circunstância e em qualquer
tempo. Apenas fotos bonitas, de bom convívio familiar e belas paisagens são
postadas. Se você vive neste planeta deve saber que o mundo não é tão cor de
rosa assim. Fique atento e não caia nessa armadilha!
A segunda situação é das pessoas que
descobriram que ser infeliz também dá ibope. Então, ao levantarem de suas
camas, logo escrevem em suas redes: “Sentindo-se infeliz!”. Depois esperam pela
enxurrada de: “o que aconteceu?/ Está tudo bem?/ Você está doente?” É comum que
essa situação dê mais ibope que a primeira, afinal a curiosidade pela tragédia
é natural dos seres humanos.
No dia a dia, quando alguém me pergunta se
estou bem, minha resposta é quase sempre sim. Porque o sim não exige
explicação. Ninguém quer saber porque você está bem. Mas responde um não para ver
quantas perguntas surgirão!!
O fato é que só sabemos que estamos felizes
porque a vida nos permite experimentar outras possibilidades. Essas experiências
não são contraditórias, mas complementares e constitutivas de quem somos.
Precisamos aprender a nos alegrar pela vida compartilhada e pelas experiências
vividas no nosso cotidiano, mesmo quando o sentimento que produzem em nós não é
o que desejávamos. Afinal, como disse Guimarães Rosa: “a felicidade se acha é
em horinhas de descuido”. Não descuide da vida!!
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