Será que as
crianças ainda querem ouvir histórias, estando cercadas por tanta tecnologia? Sim,
as crianças querem ouvir histórias, as crianças querem jogar cartas, querem
andar de bicicleta, fazer piqueniques e jogar bola. Mas as crianças não podem
fazer tudo isso sozinhas, não podem fazê-lo sem um adulto que aponte caminhos,
que construa pontes.
A pergunta que
devemos fazer não é se as crianças ainda querem, mas se os adultos ainda são
capazes de pausar seus afazeres profissionais ou domésticos, bem como
distanciar-se da tecnologia à sua volta, para passar alguns instantes vivendo o
momento presente com seus pequenos.
- Não posso perder
tempo, dizem alguns. “Só perde tempo quem acha que não tem mais tempo a perder”,
diz uma canção que gosto. Se estamos vivos, sempre há tempo. Não há tempo
perdido, há tempo investido. Tempo partilhado é tempo vivido, é tempo de
plantar semente em terra fértil. A infância é tempo de plantio e germinação. É
verdade que quando as crianças crescem tudo pode acontecer, muitos são os
fatores que contribuem para que escolham este ou aquele caminho, mas as
sementes dos bons afetos, se plantadas com carinho, tem sempre potencial para
germinar em algum momento futuro.
Contar histórias
para uma criança é plantar sementes. “As histórias são bálsamos medicinais”,
diz Clarissa Pinkola Estés. As histórias trazem em si códigos que podem nos
orientar sobre as complexidades da vida. Em uma boa história contada, narrada
pela boca de um familiar que pausa suas tarefas cotidianas para estar com sua
criança, o pequeno encontra presença amorosa, que lhe convida a viver
aventuras, a passar por lugares estranhos, experimentar o medo de modo seguro,
ampliar a imaginação de modo criativo, demonstrar sentimentos ambíguos. Uma boa
história partilhada com outra pessoa é ponto de encontro e de partida. A partir
de uma narrativa, muitos assuntos poderão surgir e serão pretexto para mais
tempo de conversa, para alinhavar próximos encontros.
Estamos entrando
no outono aqui no hemisfério sul, período de recolhimento, de ficar mais tempo
dentro de casa, de passarmos mais tempo dentro de um mesmo espaço. Mas
partilhar o espaço não significa partilhar a presença. O espaço compartilhado
não é suficiente para estar junto, é preciso intenção, desejo, tempo, pausa.
Uma boa dica é procurar, sempre que possível, juntar-se à mesa para uma
refeição, fazer o tema da escola junto com o filho, trocar 15 minutos de TV ou
computador por um livro de histórias, fazer piquenique embaixo da mesa, jogar
um jogo de tabuleiro ou de cartas. Se queremos que as crianças saiam da frente
da TV, do computador ou do celular, é preciso que nós adultos também o façamos.
É preciso estabelecer novas conexões, mais próximas, afetivas e reais. Se não o
fizermos, não adianta reclamar que os filhos crescem muito rápido.
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