Nestas férias, num
daqueles dias que começou preguiçoso, com chuvinha e nada para fazer, propus
que jogássemos um jogo de tabuleiro, daqueles que precisamos de tempo para
jogar. Penso que jogos de tabuleiro são sempre uma boa oportunidade de nos
conectarmos com o aqui e agora, uns aos outros, sem precisar de Wi-Fi.
Para a viagem eu
havia levado na bagagem um baralho e um jogo de tabuleiro que se chama
“Palavras Cruzadas”, onde cada jogador inicia escolhendo sete letras aleatórias,
pois as peças são dispostas com as letras voltadas para baixo na mesa. O primeiro
jogador inicia compondo uma palavra na vertical ou na horizontal, partindo do
meio do tabuleiro. A partir daí, com as letras que tem consigo, os jogadores vão
criando uma palavra a cada jogada, partindo ou entremeando com alguma das
palavras já colocadas na mesa, como acontece num jogo de palavras cruzadas no
papel.
Neste jogo, cada
letra tem um valor e no tabuleiro há prêmios como duplo valor da letra, triplo
valor da palavra, a partir dos quais vai sendo pontuado o valor de cada
palavra, para ao final calcular a pontuação de cada jogador.
Quando estamos a
jogar Palavras Cruzadas, vibramos quando conseguimos vogais, já que é
impossível escrever uma palavra em língua portuguesa apenas com consoantes.
Conseguir letras “a” ou um coringa é a realização. Durante uma das partidas que
jogamos eu tinha, entre minhas peças, três letras “a” e um coringa. Na rodada
seguinte, recebi mais um coringa. As letras nos chegam por sorteio e os outros
jogadores não sabem quais letras temos. Mesmo assim, eu achei injusto ter três letras
“a” e dois coringas entre as minhas sete letras. Então, devolvi uma peça de
cada à mesa e troquei por outras letras.
Como neste jogo só
trocamos as letras quando é impossível de dar andamento à construção de uma
palavra - e para isso passamos a jogada -, meu marido perguntou o que eu estava
fazendo. Quando respondi, ele falou: - Isso não é correto, a regra não é essa.
É verdade, quebrei
as regras, não apenas porque achei injusto ficar com tantas possibilidades que
me facilitariam a vitória, como também porque o mais importante naquele momento
não era vencer, mas continuar o jogo de modo que todos tivessem o mesmo prazer em
partilhar o momento.
Nem sempre o
correto é justo. Raramente equidade faz parte das regras de um jogo, ainda que
estas sejam legítimas. Naquele momento precisei escolher entre seguir as regras
corretamente ou quebrá-las a fim de proporcionar um pouco mais de equidade no
jogo. Precisei escolher entre o prazer da vitória ou o prazer de desfrutar mais
tempo com as pessoas que amo. A vitória não me faria diferença, mas o tempo de
partilhar o tempo é o que dá sentido ao viver.
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