No meu tempo a
vida era melhor. No meu tempo, as crianças eram mais educadas. No meu tempo, os
adolescentes eram menos rebeldes. Essas são afirmações que ouço com frequência,
especialmente quando mães estão reunidas, seja em reuniões de escola ou em
confraternizações.
Mas quanto somos
capazes de lembrar da nossa infância e adolescência de modo real? É muito comum
olharmos para o passado com saudosismo. Hoje conseguimos rir das quedas de
bicicleta na infância, não porque o joelho esfolado ou o braço quebrado não
doeram, certamente doeram muito. Mas, a memória de longo prazo, ao contrário da
memória de curto prazo (que é mais masoquista) parece elaborar melhor as
experiências. A memória de longo prazo, quando permitimos, torna-se uma velha
sábia. Caso contrário, vira uma velhinha muito rabugenta.
Adolescentes, em
sua maioria, sempre foram rebeldes de alguma forma e em alguma medida. Não foi
a internet que plantou a rebeldia nos adolescentes. A série “Anos Rebeldes”,
produzida no início dos anos 90, retratava a trajetória de um grupo de
adolescentes no início da década de 1960. O Festival de Woodstock, o Movimento
Tropicalista e até a Jovem Guarda, foram todos movimentos de cultura e
contracultura que ocorreram na década de 1960. Sim, os jovens já eram rebeldes nos
anos 60 e muito antes disso. Num mundo de proibições, a rebeldia se faz ainda
mais necessária.
- Mas é que na
minha época, a gente não ficava tanto tempo na frente do computador ou no
celular (!), dizem alguns. Verdade, mas é porque na nossa época não havia
celular, nem computador, nem internet, nem TV à cabo. Portanto, não temos como
saber como seríamos nós naquela época se os tivéssemos, só podemos imaginar. E
vamos, certamente, imaginar com nossa memória saudosista.
- Mas eu jamais
respondia para os meus pais, - retrucam. Será mesmo que a falta de diálogo era
um privilégio? Será mesmo que vamos carregar pelo resto dos séculos essa
herança do patriarcado? Adolescente que prende o grito na garganta não é,
necessariamente, um bom filho, é apenas um filho obediente e dócil. Prefiro o
diálogo sincero, o contraponto, a abertura, que permite colocar pra fora todos
os afetos, que oscilam de tempos em tempos, de temas em temas.
O diálogo sempre
aproxima mais do que a obediência e o silêncio. Crianças são infantis e
adolescentes são rebeldes. Seus corpos, assim como seu sistema nervoso, ainda
estão em processo de crescimento e amadurecimento. Seres humanos precisam
aprender a ver e viver no mundo aos pouquinhos. Os mais experientes precisam ensinar
os mais novos e também aprender com eles.
Quando uma criança
nasce, quando o adulto se dispõe a cuidar de uma criança, nasce nesse desejo um
pai e/ ou uma mãe. Não nascemos pais, nos tornamos pais com nossos filhos e
esse é um processo de ensinar e aprender mútuo. Aprendemos todos os dias com
nossos filhos, ou deveríamos aprender a aprender todos os dias com eles, ao
invés de querer ficar apontando como no nosso tempo tudo era melhor. O nosso
tempo é hoje e a memória guarda o passado. Então, façamos do hoje um passado
melhor para nós, nossos filhos, sobrinhos, enteados, netos, alunos.
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