Se é verdade (e eu penso que
é) que “cada ser humano carrega, em potencial, o pior e o melhor do humano, [e]
que a desumanidade faz parte da humanidade”, como fala Edgar Morin, faz sentido
pensar que em cada um de nós habita um ser humano potencialmente amoroso e
perverso. A questão é achar o ponto de equilíbrio no que nos constitui. Lembrei dessa ponderação de Morin
ao me deparar com duas postagens que acabo de ler no Facebook. A primeira
notícia informa que “em uma das noites mais frias do ano, moradores de rua de
SP são acordados com jatos d'água”. A segunda notícia, intitulada “Cabide Livre incentiva a doação de agasalhos”,
fala sobre o projeto de um grupo de jovens profissionais que se uniram para
fazer o bem. O Cabide Livre é uma das ações do Movimento Canto Livre (Santa
Cruz do Sul, RS). O projeto consiste em distribuir cabideiros em pontos
estratégicos, para que as pessoas possam deixar agasalhos para doação. E quem
estiver precisando do agasalho – como aqueles moradores de rua de São Paulo – possa
ter acesso a uma roupa quentinha para afugentar o frio.
Penso que colocar-se no lugar
do outro é impossível. Mesmo que nos proponhamos a passar uma madrugada fria na
rua, como aquelas pessoas que lá residem, sabemos que temos para onde voltar
quando não suportarmos mais o frio, ou quando a experiência acabar, ao
contrário de quem mora nas ruas.
Mas é possível ter empatia, é
possível ser solidário. Empatia é o ato de tentar compreender a perspectiva de
outra pessoa. No entanto, para compreender a perspectiva de outra pessoa é
preciso reconhecer o outro como um semelhante diferente de mim. A isso chamamos
alteridade. O conceito de alteridade “parte do pressuposto de que todo
indivíduo social é interdependente dos demais sujeitos de seu contexto social,
isto é, o mundo individual só existe diante do contraste com o mundo do outro”.
No caso dos moradores de rua
de São Paulo, que foram acordados no meio de uma madrugada fria, com água
gelada sendo jogada sobre seus corpos. Pode-se pressupor que as pessoas que o
fizeram são desprovidas de alteridade para com aqueles seres humanos. Não os
veem como semelhantes, não os veem como seres humanos que são.
Penso que a alteridade
antecede a empatia. Preciso primeiro reconhecer o outro como legítimo outro,
semelhante e ao mesmo tempo diferente de mim. Isso nos possibilita ter empatia
e com ela nasce o desejo de ser solidário.
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