domingo, 6 de agosto de 2017

REGULAMENTAÇÃO DO OFÍCIO DO CONTADOR DE HISTÓRIAS: RUMINAÇÕES SOBRE O PL 7232/2017


A luta para que a Contação de Histórias seja reconhecida como profissão é a mesma de tantos outros artistas. Se a pessoa diz que é ator, artista plástico, músico ou contador de histórias, sempre haverá quem pergunte: Tá, mas qual a tua profissão? Acontece que em nossa sociedade, artistas ainda são considerados vagabundos, desocupados.
Quem não produz arte não imagina que arte é também transpiração, não nasce apenas de um sopro de luz divina que nos inspira. Quando se escreve um texto, mesmo que ele tenha brotado de uma inspiração, há muita lapidação sobre ele para que se torne um bom texto literário. Quando narra-se uma história, há que se ter ouvido muitas histórias, lido tantas outras, pesquisado sobre o folclore e a cultura de um povo, pensado na voz, no gesto, na intencionalidade.  
Em 2012, a Deputada Federal Erika Kokay, que é comprometida com a cultura, apresentou o Projeto de Lei n° 4005/2012, que propõe que haja a Semana Nacional dos Contadores e Contadoras de Histórias. Acredite, mas o projeto ainda aguarda designação de relator na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara Federal (CCJC).
Neste ano, a Deputada Erika Kokay apresentou um novo projeto (Projeto de Lei n° 7232/2017), que visa regulamentar a Profissão dos Contadores de Histórias. Acontece que o Projeto de Lei n° 7232/2017, nasce a partir do debate de um grupo pequeno de Contadores de Histórias. Projeto este que já foi aprovado na Comissão de Trabalho e é terminativo na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania.
Embora em sua página a Deputada diga que o projeto visa regulamentar a profissão e valorizar a atividade do Contador de Histórias, sem o objetivo de burocratizar, o texto do projeto, em vários momentos, justamente burocratiza e elitiza o fazer do Contador de Histórias, excluindo muitos narradores que tiveram sua formação no fazer cotidiano da oralidade.
Como bem expõe o texto da Deputada Erika em sua página na internet, nós também queremos “que os contadores e contadoras exerçam sua profissão e sejam valorizados pelo seu saber, que não é um saber menor, posto que é construído a partir dos fios da cultura e do imaginário popular”.
Por essa razão é que em vários estados do país muitos Contadores de Histórias estão articulados para que haja um debate sério sobre esta questão. Precisamos de valorização sim, mas não queremos correr o risco de uma regulamentação que possa cercear ou excluir muitos narradores.
Precisamos de tempo para ruminar, nos questionarmos com mais clareza e então contribuir. Estamos passando por um momento politicamente frágil em nosso país, momento perigoso para decisões apressadas, como tantas que tem sido tomadas em Brasília. Não podemos concordar com uma lei que possa deixar tantos narradores de fora, precisamos primeiro firmar melhor nossa identidade coletiva para só então construirmos pactos coletivos.   
Por fim, como tão bem expressou o parceiro de caminhada Warley Goulart, é “lindo sim ver tanta gente querida reunida em vários pontos do país [debatendo os aspectos dessa lei]. Mas é uma pena constatar que a faísca deste repentino encontro partiu de um sentimento generalizado de desconfiança. Nossa atual mobilização não surgiu da união, ela nasceu da desconfiança. E a desconfiança não é pessoal. A desconfiança está no texto-base do projeto de lei em questão. Para nós narradores, a palavra oral e/ou escrita tem importância sem tamanho, por isso acho preocupante que um texto-base sobre este assunto tenha sido mal redigido e não tenha levado em consideração delicadezas da nossa arte”.

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